terça-feira

A "compra" de atenção nos media sociais. O Facebook

À noção de comércio de mercadorias regulada pelo dinheiro sucede-se a ideia de comércio de atenção, qual capital social que abrange vários componentes de transacção de atenção e de trade-of de pontos de vista entre as pessoas que agora se relacionam através dos media sociais.
A ideia subjacente a este tipo de relação emergente é a de que as pessoas passaram a valorizar mais as opiniões dos outros. Esta dinâmica tem implicações sociais, uma das quais é que em vez de sermos nós próprios a procurar serviços e produtos, são estes que podem vir ao nosso encontro. O que já não é novidade na net.
Dou um exemplo comezinho, mesmo no plano político que, de certo modo, surpreendeu Portugal e os portugueses. Na sequência das declarações de Cavaco sobre o valor das suas pensões de reforma, foi posta a circular na rede uma petição com o fito de reclamar a sua demissão. E em breves dias a referida petição foi assinada por dezenas de milhares de pessoas que, on line, fizeram a sua manifestação de vontade na sequência daquelas abjectas declarações, o que obrigou o PR a retratar-se mediante comunicados, embora o tenha feito de forma ainda mais abjecta do que o teor das suas declarações iniciais. Ou seja, pior a emenda do que o soneto...
Eis um exemplo oriundo da área política, da pequena política, em como as redes sociais facilitam exponencialmente a disseminação de informação. Para o melhor e para o pior, e o mais curioso é que Cavaco, ou alguém por ele no Palácio Rosa, é um utilizador intensivo do Facebook. Portanto, conhece bem o êxito dos novos media, e, agora, paradoxalmente, conheceu bem o seu lado mais negro.
Nesta linha de disseminação da informação, conferindo-lhe um carácter quase instantâneo, é que também se explica a popularidade de outras ferramentas virtuais, como o twitter e, mais interessantes, o microblogging. É através destas ferramentas que os seus utilizadores informam a sua rede de amigos do que estão a fazer e a partilhar com eles os seus interesses pessoais, intelectuais, de lazer, os mais variados.
No caso particular do Facebook, por ser o "rei" destas ferramentas virtuais mais populares do momento, importa sublinhar as chamadas actualizações de estado que cada um dos utilizadores vai fazendo, pois é a partir delas que os amigos virtuais dessa rede são informados do que cada um está a fazer e que opiniões estão sendo desenvolvidas e que assuntos debatidos, expressando, ao mesmo tempo, sentimentos, afectos e os estados de espírito daqueles que integram essa rede de amigos.
Hoje várias centenas de milhões de histórias, ou actualizações de estado diárias, são debitadas na rede e alimentadas pelos feeds de informação que asseguram a sua manutenção.
Hoje, estamos um pouco no cruzamento destas trocas de informações que, certamente, tem mais interesse nuns casos do que noutros. Como, de resto, em tudo na vida.

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segunda-feira

Esperança ou queda...na rota do desenvolvimento social

Cada homem seguiu o seu caminho sem cuidar do que podia representar uma grande esperança, ou, ao contrário, comprometer dramaticamente o equilíbrio no interior das sociedades europeias, e o da humanidade no seu conjunto. Durante décadas, ninguém teve em consideração a sua existência e o seu valor potencial, não para a recusar em bloco, mas, ao invés, para acolher todas aquelas virtualidades, ainda realizáveis, que pudessem revelar-se favoráveis a todos. Ou, pelo menos, ao maior número.
Ante toda esta desgraça social, económica, financeira que varre hoje as sociedades europeias, e não só, é legítima a questão: como é que não modificámos os nossos próprios conceitos de trabalho, organização da produção, competitividade, emprego, sociedade e bem-estar social, em ordem a obter consequências tão racionais quanto benéficas para o conjunto da sociedade?!
Sobretudo, atendendo à velocidade do progresso tecnológico que, por si, prometia tanto a toda a gente. Este é também um dos paradoxos (alucinantes) do nosso tempo.

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Classe média está em risco de “implosão” - ensaio de Elísio Estanque -

Sociólogo diz que políticos deviam estar mais preocupados com "a possível implosão" da classe média (Nuno Ferreira Santos). via Público.
Num ensaio que esta semana chega às bancas, o sociólogo Elísio Estanque analisa a ascensão e declínio dos segmentos sociais que hoje estão rotulados como "os novos pobres".
Quando entram no Gabinete de Apoio ao Sobreendividado da Deco, a primeira pergunta que as pessoas fazem é: "Esta conversa fica só mesmo entre nós?" A resposta - "sim" - é essencial para o prosseguimento do diálogo. Algumas têm os vencimentos penhorados e já cortam na própria alimentação, mas fora daquelas quatro paredes agem como se nada tivesse mudado, mesmo junto de familiares e de amigos. Fazem parte de uma classe média "doente" e "em declínio", tema do ensaio do sociólogo Elísio Estanque que avisa que "os poderes políticos deviam estar mais preocupados com a possível implosão deste grupo do que com a sua eventual manifestação nas ruas".
No seu escritório, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, o investigador do Centro de Estudos Sociais folheia um jornal. Pode ser o do dia, o da véspera ou o da semana anterior, "não interessa", diz - "Todos os dias há algo de novo: o acordo de concertação social, o anúncio de uma nova vaga de excedentários na função pública, o abandono da universidade pelos estudantes, as novas vagas de desemprego, o aumento das taxas moderadoras, a desmontagem do Estado Social – está tudo a acontecer de uma forma extraordinariamente rápida e intensa", comenta. Aponta o livro editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que este fim-de-semana chega às bancas com o título A Classe Média: Ascensão e Declínio, e admite: "Se fosse hoje, provavelmente trocaria o termo "declínio" por "queda".
No ensaio, Elísio Estanque vai para além da sistematização teórica. A segunda parte do livro é dedicada às particularidades do caso português, no que respeita "à célere e pouco sustentada ascensão da classe média" e também à forma como ela "agora se desmorona, de maneira igualmente rápida e abrupta, na sequência do "empurrão" da crise e das medidas de austeridade".
O ponto de chegada do sociólogo é uma classe média " fraca e ameaçada de ‘proletarização’"; o ponto de partida de uma sociedade "que em escassas dezenas de anos passou de predominantemente rural a marcadamente urbana". Os dados são objectivos: a população activa no sector primário encolheu de 43,6 por cento em 1960 para 11,2 em 1991 e a do sector terciário cresceu, no mesmo período, de 27,5 para 51,3 por cento.
O peso da classe média - "que até 1974 era absolutamente residual", nota o investigador – resulta, na sua perspectiva, de vários factores conjugados. Refere-se à progressiva generalização da frequência do ensino superior que se reflectiu na proliferação das profissões liberais; e também ao crescimento do sector público, que vê como o principal canal de mobilidade ascendente para as classes trabalhadoras, graças às políticas centradas em áreas como a Educação, a Saúde, a Justiça ou a Administração Pública.
A afirmação do Estado Social e os fenómenos de litoralização do país e de concentração urbana são outros dos factores que na sua óptica "se viriam a mostrar decisivos quando, após a instabilidade dos anos 80, Portugal entrou numa espécie de euforia política e económica", acentuada pela entrada de fundos da Comunidade Europeia.
Despido da fundamentação teórica, o retrato é quase caricatural. Elísio Estanque fala dos grupos instalados nas periferias urbanas que alimentam a ambição de ascensão social tendo como termo de comparação o mundo rural, contingente e precário da geração dos pais. Considera que aqueles grupos, ao conquistarem empregos "limpos", que imaginavam estáveis e seguros, acreditaram estar, "desde logo, confortavelmente instalados na classe média". É neste contexto, analisa, que se dá o "casamento" que o investigador considera "fatal": a ânsia daqueles grupos de adoptarem padrões de vida europeus, modernos e urbanos coincide com o florescer do mercado do crédito.
[...]
Obs: Um trabalho cuja tendência social merecia tratamento e devida publicitação. Ainda bem que o mesmo é feito por um sociólogo, Elísio Estanque, sempre preocupado com este tipo de problemáticas em Portugal.

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sábado

Novo ano, a mesma crise - por George Soros -

  • Presidente do conselho de administração do Soros Fund Management e do Open Society Institute.
    As medidas introduzidas pelo Banco Central Europeu em Dezembro, nomeadamente a operação de refinanciamento de longo prazo (LTRO, na sigla em inglês), aliviaram os problemas de liquidez dos bancos europeus, mas não acabaram com a desvantagem dos Estados-membros altamente endividados. Uma vez que os elevados prémios de risco sobre os títulos soberanos ameaçam os rácios de capitais dos bancos, uma solução pela metade não basta.
Na verdade, a suposta solução relega metade da zona euro para o estatuto de países do Terceiro Mundo, que passaram a estar fortemente endividados numa moeda estrangeira. Em vez do Fundo Monetário Internacional, é a Alemanha que está a actuar como o capataz, impondo uma disciplina orçamental inflexível sobre esses países. Isto irá gerar tensões políticas e económicas que podem destruir a União Europeia.
Propus um plano que iria permitir à Itália e à Espanha refinanciar a sua dívida através da emissão de Bilhetes do Tesouro com juros de 1%. Dei-lhe um nome em homenagem ao meu amigo Tomasso Padoa-Schioppa, que, enquanto presidente do banco central de Itália nos anos 90, ajudou a estabilizar as finanças públicas do país.
O plano é um tanto ou quanto complicado, mas é sólido em termos legais e técnicos. Descrevi-o em detalhe no meu novo livro Financial Turmoil in Europe and the United States [Turbilhão Financeiro na Europa e nos Estados Unidos].
As autoridades europeias rejeitaram o meu plano em detrimento da LTRO. A diferença entre as duas soluções é que a minha iria permitir um alívio instantâneo para a Itália e a Espanha. Pelo contrário, a LTRO permite que os bancos italianos e espanhóis se dediquem a uma arbitragem bastante lucrativa e praticamente isenta de risco, mas mantém a dívida dos Estados a oscilar à beira de um precipício – apesar de os últimos dias terem trazido algum alívio.
A minha proposta é usar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF) e o Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira (MEEF) para conferir ao Banco Central Europeu um seguro contra o risco de solvência associado a quaisquer novos Bilhetes do Tesouro italianos ou espanhóis que venha a comprar aos bancos comerciais. Isto iria permitir à Autoridade Bancária Europeia reconhecer estes vários títulos de dívida como equivalentes a dinheiro, visto que poderiam ser vendidos ao BCE a qualquer altura.
Deste modo, os bancos teriam vantagem em canalizar o seu excedente de liquidez para estes Bilhetes do Tesouro, desde que estes títulos rendessem mais juros do que os depósitos junto do BCE. A Itália e a Espanha seriam assim capazes de refinanciar a sua dívida a taxas de juro próximas das dos depósitos do BCE, que estão actualmente em 1% para as reservas obrigatórias e em 25 pontos-base [0,25%] para os depósitos acima dessas reservas.
Isto iria melhorar bastante a sustentabilidade da dívida destes países. A Itália, por exemplo, iria ver o seu custo médio de financiamento descer dos actuais 4,3%. A confiança iria gradualmente regressar, as taxas de juro sobre a dívida já emitida iriam baixar, os bancos deixariam de ser penalizados por deter dívida italiana, e a Itália iria, a pouco e pouco, recuperar o acesso ao mercado a taxas de juro mais razoáveis.
Uma objecção óbvia a esta estratégia é que iria reduzir a maturidade média da dívida italiana e espanhola. Contudo, acredito que isso seria uma vantagem nas actuais e excepcionais circunstâncias, porque iria manter os Governos italiano e espanhol com trela curta. Nenhum país poderia dar-se ao luxo de perder a ajuda do BCE.
No caso da Itália, esta trela curta iria dissuadir o antigo primeiro-ministro Silvio Berlusconi de tentar derrubar o novo Governo de Mario Monti (que tem uma maioria frágil), porque, se Berlusconi precipitasse uma eleição, o eleitorado iria puni-lo. Isso iria ajudar a restabelecer a estabilidade política e acelerar o regresso de Itália aos mercados.
A minha proposta segue tanto o conteúdo como o espírito do Artigo 123 do Tratado de Lisboa. A tarefa do BCE seria fornecer liquidez aos bancos, enquanto o FEEF e o MEEF seriam concebidos para absorver o risco de solvência. O BCE não estaria a fornecer financiamento adicional aos países-membros, mas apenas a permitir-lhes refinanciar a sua dívida a um custo mais baixo.
Juntos, o BCE e o FEEF poderiam fazer o que o BCE não pode fazer sozinho. Até que os países-membros concebessem uma solução mais permanente, isto permitiria um alívio temporário decorrente de uma imperfeição fatal no projecto do euro.Deste modo, o FEEF teria uma capacidade praticamente ilimitada de garantir os Bilhetes de Tesouro da zona euro, porque nenhum país poderia entrar em default[incumprimento] enquanto este esquema estivesse em vigor. Nenhum país poderia, também, abusar do privilégio, caso contrário este ser-lhe-ia retirado, o que levaria os custos do financiamento a subir imediatamente.
Pela primeira vez nesta crise, as autoridades europeias iriam levar a cabo uma operação para a qual têm recursos mais do que suficientes. Constituindo uma surpresa positiva para os mercados, iria reverter o seu estado de espírito. Afinal de contas, os mercados têm estados de espírito e é isso que as autoridades têm de aprender para lidar com as crises financeiras.
Contrariamente ao discurso actual, a solução de longo prazo deve fornecer um estímulo para tirar a Europa de um ciclo vicioso de deflação – e as reformas estruturais, por si só, não bastam. O estímulo tem de vir da União Europeia, já que os países vão estar sob apertada disciplina orçamental. Esse estímulo terá de ser garantido de forma conjunta e solidária – e isso significa eurobonds [emissão conjunta de dívida europeia] de uma forma ou de outra.
Tradução Project Syndicate
Obs: É interessante registar que Soros se converteu num grande filantropo depois de ter sido um grande especulador.

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quinta-feira

Governação mundial sem liderança - por Dani Rodrik

Professor da Universidade de Harvard, Dani Rodrik
A economia mundial está a entrar numa nova fase, na qual o alcance da cooperação global tornar-se-á cada vez mais difícil. Os Estados Unidos e a União Europeia, agora sobrecarregados pelo elevado endividamento e o baixo crescimento – e, portanto, preocupados com questões internas – já não são mais capazes de definir regras mundiais e esperar que outros alinhem.
A agravar esta tendência, potências emergentes, como a China e a Índia, atribuem muita importância à soberania nacional e à não interferência em assuntos internos. Isso faz com que não estejam dispostas a submeter-se a regras internacionais (ou a exigir que outros respeitem tais regras) – sendo assim improvável que invistam em instituições multilaterais, tal como os EUA fizeram no rescaldo da II Guerra Mundial.
Como resultado, a liderança e a cooperação mundial permanecerão com uma oferta muito limitada, exigindo uma resposta cuidadosamente ponderada na governação da economia mundial – mais especificamente, um magro conjunto de regras que reconheça a diversidade das circunstâncias e exigências nacionais em prol de uma autonomia política. Mas as discussões do G-20, da Organização Mundial do Comércio e de outras instâncias multilaterais prosseguem como se o remédio santo fosse mais do mesmo – mais regras, mais harmonização e mais disciplina nas políticas nacionais.
No que diz respeito ao essencial, o princípio da “subsidiariedade” oferece a forma correcta de pensar sobre as questões de governação mundial. Diz-nos quais os tipos de políticas que devem ser coordenadas ou harmonizadas a nível mundial e quais devem ser maioritariamente destinadas aos processos de decisão internos. O princípio demarca as áreas onde precisamos de uma governação mundial extensa, daquelas onde apenas uma fina camada de regras globais é suficiente.
As políticas económicas baseiam-se aproximadamente em quatro variantes. Num extremo estão as políticas internas que não criam (ou criam muito poucas) repercussões além das fronteiras nacionais. As políticas de educação, por exemplo, não necessitam de qualquer acordo internacional e podem ser deixadas, com segurança, entre os processos de decisão internos.
No outro extremo estão as políticas que implicam o “património comum mundial”: o resultado de cada país é determinado não pelas políticas internas, mas pela (soma total das) políticas dos outros países. As emissões de gases com efeito de estufa são o caso arquetípico. Em tais domínios políticos existem fortes argumentos para se estabelecer regras vinculativas mundiais, uma vez que cada país, entregue a si próprio, tem interesse em negligenciar a sua parte na preservação do património comum mundial. A incapacidade de obter um acordo global condenaria toda a gente a uma catástrofe colectiva.
Entre os extremos estão outros dois tipos de políticas que criam repercussões mas que precisam de ser tratadas de forma diferente. Primeiro, existem as políticas “prejudicar o vizinho”, por meio das quais um país retira benefícios económicos à custa de outros países. Por exemplo, os seus líderes limitam o fornecimento de um recurso natural, no sentido de aumentar o seu preço nos mercados mundiais ou prosseguem com políticas mercantilistas, na forma de grandes excedentes comerciais, sobretudo em situações de desemprego e de excesso de capacidade.
Uma vez que as políticas “prejudicar o vizinho” criam benefícios, através da imposição de custos sobre os outros, também necessitam de ser reguladas a nível internacional. Este é o argumento mais forte para submeter as políticas monetárias da China ou os fortes desequilíbrios macroeconómicos, como o excedente comercial da Alemanha, de forma a existir uma maior disciplina global, em relação à que existe actualmente.
As políticas “prejudicar o vizinho” devem ser distinguidas das políticas que se poderiam chamar de “prejudicar-se a si mesmo”, cujos custos económicos são suportados principalmente em casa, embora possam também afectar os outros.
Considere os subsídios agrícolas, a proibição de organismos geneticamente modificados ou uma regulação financeira negligente. Embora estas políticas possam impor custos a outros países, elas não são utilizadas para se extrair vantagens mas sim porque outros motivos políticos internos – tais como os distributivos, os administrativos ou as preocupações de saúde pública – prevalecem sobre o objectivo da eficiência económica.
O argumento da disciplina global é bastante mais fraco com as políticas “prejudicar-se a si mesmo”. Afinal de contas, não deve ser da responsabilidade da “comunidade mundial” dizer a cada país como deve agir para influenciar os objectivos concorrentes. Impor custos a outros países não é, por si só, um motivo para a regulação mundial. (Na verdade, os economistas dificilmente reclamam quando a liberalização comercial de um país prejudica os concorrentes). As democracias, em particular, devem ter o direito de cometer os seus próprios “erros”.
Naturalmente, não há nenhuma garantia de que as políticas internas reflictam com exactidão as exigências da sociedade; até mesmo as democracias são feitas reféns por interesses especiais, com alguma frequência. Sendo assim, o argumento da regulamentação mundial assume uma forma bastante diferente com as políticas “prejudicar-se a si mesmo” e exige requisitos processuais destinados a melhorar a qualidade das políticas internas. Os padrões globais referentes à transparência, à ampla representação, à responsabilidade e à utilização de provas empíricas, por exemplo, não limitam o resultado final.
Diferentes tipos de política exigem diferentes respostas a nível mundial. Actualmente é desperdiçado bastante capital político a nível mundial para harmonizar as políticas “prejudicar-se a si mesmo” (principalmente nas áreas do comércio e da regulação financeira) e não é gasto o suficiente nas políticas “prejudicar o vizinho” (tais como os desequilíbrios macroeconómicos). Esforços demasiado ambiciosos e mal direccionados na governação mundial não serão benéficos para nós numa altura em que a oferta de uma liderança e de uma cooperação mundial continua limitada.
Tradução de Deolinda Esteves/Project Syndicate
Obs: um artigo interessante, marca uma tendência de comportamento previsível dos agentes políticos internacionais para a próxima década.

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quarta-feira

Notícias do Reino: El Rei D. Carlos do Reino de Portugal

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terça-feira

Sebastianismo e Quinto Império" Inéditos de Fernando Pessoa sobre sebastianismo e Quinto Império são publicados quinta-feira

Nota prévia: remexer em F.Pessoa é sempre um acto cultural por excelência. É nosso, mas tem valia universal. (re)Meditemo-lo.
Quarenta e três textos inéditos de Fernando Pessoa sobre sebastianismo e o Quinto Império foram encontrados na sua famosa arca pelos investigadores Pedro Sepúlveda e Jorge Uribe e publicados com outros 58 já conhecidos sobre o mesmo tema.
O resultado estará a partir de quinta-feira nas livrarias portuguesas, numa edição da Ática, chancela da Babel, sob o título “Sebastianismo e Quinto Império”, mais um volume da Nova Série de Obras de Fernando Pessoa, coordenada pelo pessoano colombiano Jerónimo Pizarro.
“[Em D. Sebastião], Pessoa encontra uma figura para falar de Portugal de uma maneira que, ao mesmo tempo, o aproxime a uma tradição popular, que é o que lhe interessa, mas também faça um certo afastamento de outros autores”, disse à Lusa o investigador colombiano Jorge Uribe.
“Acho que um dos principais interesses de Pessoa pela figura de D. Sebastião tem que ver com uma maneira de fazer frente a Camões: D. Sebastião é uma personagem de ‘Os Lusíadas’, de Camões, todo o poema épico é dedicado a D. Sebastião, mas o D. Sebastião que está por vir depois de ‘Os Lusíadas’ é uma oportunidade para Pessoa se defrontar com aquele que era o seu precursor literário mais importante”, defendeu.
Segundo este pessoano, entre muitos outros aspectos, o mais importante é que a utilização da figura de D. Sebastião é, para Fernando Pessoa (1888-1935), “uma maneira de entrar na História de Portugal onde Camões a deixou”.
Esta obra – que abre logo com o horóscopo de D. Sebastião feito por Pessoa, não é - sublinham os investigadores na introdução – um volume que o escritor tivesse deixado pronto para dar à estampa ou a que tivesse sequer dado alguma organização específica.
Trata-se, sim, de “uma compilação temática dos fólios do autor”, que implicou que percorressem “diversos géneros de obra escrita (manifestos, respostas a inquéritos, cartas, planos, ensaios), assim como distintos tons dessa mesma obra (o sociológico, o provocatório, o hermético, entre outros)”.
Também na introdução, Pedro Sepúlveda e Jorge Uribe explicam que “o critério fundamental de reunião dos materiais que se seguiu foi o de que o livro reuniria a prosa de Pessoa sobre a dimensão mítica da nacionalidade portuguesa, expressa em dois mitos fundamentais, o regresso de D. Sebastião e a concretização do Quinto Império”.
Sobre o Quinto Império, Jorge Uribe explicou à Lusa a aproximação de Pessoa a essa tradição profética: “O Quinto Império é uma tradição profética muito extensa, muito grande, que vem de uma leitura de um texto hebraico, do Livro de Daniel, que está no Antigo Testamento, mas que começa na tradição cristã desde muito cedo a tentar descobrir que Nação será esse Quinto Império definitivo”.
“Estamos a falar de alguns intérpretes de profecias ou dos pais da Igreja, mesmo – como, por exemplo, Tertuliano – que começaram a tentar fixar qual ia ser essa Nação definitiva”, sublinhou.
Trata-se – prosseguiu – de uma tradição profética “que está à procura da compreensão da revelação última, da Nação última, e isto faz com que Pessoa, procurando essa interpretação para Portugal, esteja a aproximar-se de uma tradição de quase mil anos – do lado cristão, porque do lado hebraico são mais”.
“São grandes tradições, de grandes livros, de grandes nomes, de grandes leituras, dos quais Pessoa era um constante seguidor. Realmente, o que nos interessou, neste livro, foi aproximarmo-nos de um Pessoa leitor, um Pessoa que está em constante contacto com centenas de livros e cuja escrita depois reflecte o que ele aprende nestes livros”.
A existência de tantos inéditos sobre este tema é explicada pelos dois pessoanos pela “dificuldade de leitura de uma boa parte dos documentos” e pela sua “dispersão pelo espólio”, que se encontra dividido entre a Biblioteca Nacional e a Casa Fernando Pessoa.

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segunda-feira

Woorking poors e o rapaz de Boliqueime

Existe nos EUA uma categoria de pessoas que trabalham em full time e que não ganham o suficiente para sair da miséria. Esses working poors são mais de 10 milhões na terra do Tio Sam.
Essa situação, considerada aberrante, é consequência directa da "tal" flexibilidade das empresas, facilidade que não é concedida aos assalariados.
Naturalmente, os europeus conhecem esta face negra dos EUA, que não vive só do sucesso aparente patente na Pub. e nos filmes.
Hoje, assistimos a mais insegurança, mais milhões de salários pagos miseravelmente, agravamento das desigualdades sociais que se aprofundam à medida que uma massa de assalariados empobrece enquanto que uma minoria enriquece cada vez mais depressa.
Mesmo que nesta última categoria sociológica estejam alguns idiotas da república que, de quando em vez, dizem o que verdadeiramente pensam, e o que pensam é bem ilustrativo do desprezo que sentem pelo povo que alegadamente representam.
Como conclusão, direi: há dias o povo português ficou a conhecer bem o desprezo que aquele que representa o vértice do Estado nutre pelo zé povinho que sub-representa.

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Portugal está a exportar o seu desemprego para Angola

"Portugal está a exportar o seu desemprego para Angola"
- Lusa - via dn -
O economista
angolano Manuel Alves da Rocha alertou hoje que "Portugal está a exportar o seu desemprego para Angola", o que poderá provocar "fissuras sociais", e defende
u que Luanda deve reservar empregos para os nacionais.
Numa altura em que governantes portugueses apontam a emigração como uma possível saída para a crise, Alves da Rocha recordou que "Angola tem uma elevadíssima taxa de desemprego", estimada em 26 por cento, e que a comunidade portuguesa no país já está avaliada em cerca de 130 mil pessoas.
Trata-se, sublinhou, de uma comunidade "com uma componente técnica muito importante", que acaba por "barrar a entrada de quadros angolanos" no mercado de trabalho.
Defendeu que o governo português está a tentar encontrar na emigração "uma saída
para diminuir as tensões sociais" decorrentes da crise, mas alertou que Angola poderá sofrer as consequências dessa aposta.
"As relações com Portugal vão acabar por agravar a situação do desemprego em Angola", afirmou, em declarações à Lusa nas vésperas de uma deslocação do ministro da Economia angolano a Lisboa.
Professor catedrático na Universidade Católica de Luanda, Alves da Rocha afirmou que a instituição já está a sentir o problema: "Os nossos jovens licenciados não têm um leque de oportunidades junto das empresas estrangeiras e as empresas angolanas ainda são poucas e não têm capacidade para absorver a capacitação técnica que as universidades vão lançando para o mercado".
Obs: Procurar estruturar uma política externa do emprego alicerçada em Angola é, não só perigoso para as relações bilaterais entre Angola e Portugal, como revela miopia por parte dos proponentes dessa "ideia". Além de ainda podermos ser acusados de racismo invertido e fautores dum colonialismo de vanguarda na Europa inédito na história (moderna e contemporânea) das Relações Internacionais.

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sexta-feira

Democracia em perigo - por Dominique Moisi -

Dominique Moïsi
Autor da obra The Geopolitics of Emotion
Será o tempo democrático demasiado lento para responder a crises e demasiado curto para planear o longo prazo?
Numa altura de crise económica e social cada vez mais profunda em muitas das democracias ricas do mundo, essa questão é altamente relevante. Em Itália, por exemplo, o primeiro-ministro tem a ambição necessária e legítima de levar a cabo reformas amplas. Ele é simultaneamente competente e honesto, mas enfrenta um impedimento quase estrutural: ao passo que os líderes tinham antes três anos para convencer os eleitores dos benefícios das suas políticas, têm agora três horas para convencer os mercados financeiros globais que a sua abordagem merece apoio.
Encurralado por legisladores italianos que, no fundo, não entendem essa mudança nem mercados que buscam certezas quase imediatas, poderá Monti transcender a sua prudência natural e agir de maneira suficientemente clara e decidida?
Também nos Estados Unidos o sistema político se está a tornar cada vez mais disfuncional. O filósofo político Francis Fukuyama vai mesmo ao ponto de dizer que a “vetocracia” poderá triunfar sobre a democracia, independentemente de quem vencer a eleição presidencial de 2012. A separação de poderes, um princípio estabelecido pelos fundadores dos EUA influenciados por filósofos como Montesquieu, está a provocar hoje uma quase-paralisia.
As democracias sofrem não apenas pelo seu lento tempo de reacção em momentos de crise, mas também pela dificuldade que enfrentam em projectar-se no futuro e em planear no longo prazo. Em ambos os lados do Atlântico, os líderes políticos sabem o que devem fazer pelos seus países, mas não sabem como assegurar a sua reeleição se realmente o levarem a cabo. Parecem estar estruturalmente condenados a uma postura de curto prazo.
Mas não é porque as democracias têm um “problema temporal” que a sua era parece, a alguns, estar terminada. A China sente-se adequadamente orgulhosa por ser capaz de se projectar no século XXII. Mas a China deve muito mais essa qualidade de pensamento de longo prazo à sua cultura que à natureza do seu sistema político. Os chineses pensam no longo prazo porque são chineses e não por não serem democratas.
É claro que os líderes da China podem reagir a ocorrências sem muita consideração pela opinião pública chinesa. Afinal, a grande maioria dos chineses não sonha com a democracia, mesmo que algo parecido com uma sociedade civil esteja a emergir, gerando novos interesses e exigências que não podem mais ser controladas ou manipuladas completamente, como no passado.
Mas essa é precisamente a fraqueza dos regimes não-democráticos numa era global dominada pela transparência: Quem sonha em tornar-se um cidadão chinês, ou mesmo um cidadão de Singapura? No rescaldo da sucessão hereditária na Coreia do Norte, os pensadores estratégicos salientam correctamente o papel crucial da China na configuração do futuro da península. Mas, não obstante as cenas de histeria que se seguiram à morte do “Grande Líder” Kim Jong-il, a maioria dos norte-coreanos sonha provavelmente em unir-se à democrática Coreia do Sul (mesmo que muitos sul-coreanos receiem esse cenário).
A maioria dos chineses pode não querer ser governada como ocidentais, mas seria errado assumir que a sua única ambição é gastar como ocidentais. Quanto mais bem-sucedidos forem, mais individualistas se tornarão e mais esperarão o respeito e a consideração daqueles que os governam.
Em contraste, se o crescimento económico da China abrandar, o que é provável nos próximos anos, o protesto contra a corrupção – uma fonte de fragilidade para qualquer regime – escalará. Na verdade, é importante retermos que, em vésperas da próxima transição de liderança chinesa, só foram escolhidos os ocupantes para os dois postos mais elevados, e isso por um processo de sagração gradual em que, no máximo, participou uma centena de pessoas.
A crise actual nos países avançados, que poderá muito bem conduzir a uma recessão global (se não estiver já a fazê-lo), não revela apenas as muitas maleitas dos regimes democráticos, mas também age como incubador e acelerador desses males. E afinal a crise pode acabar por ter um impacto ainda maior em sistemas não-democráticos que parecem ser mais eficientes, mas são na verdade muito mais frágeis. Vemos isso com a crescente agitação tanto na Rússia como na China.
Contrariamente ao que se poderia pensar, a democracia é mais resiliente do que as alternativas a longo prazo. Isto permanecerá verdade enquanto os democratas permanecerem convencidos disso. Os modelos não-democráticos não podem verdadeiramente desafiar a democracia. Apenas o mau comportamento dos democratas pode fazê-lo.
Tradução de António Chagas/Project Syndicate
Obs: Interessante artigo que passa em revista as condições de exercício da democracia no mundo. Mas considerar que os norte-coreanaos gostariam de unir-se aos democratas sul-coreanos será, porventura, um exagero do autor do artigo. Salvo se essa reunificação se realizar sob condições e termos da Coreia do Norte, o que conduzirá a um impasse não-democrático. Seja como for, parece-me que a natureza da democracia - global, europeia - não deverá sucumbir às imposições e caprichos dos mercados, para isso existem normas que limitem o seu poder que hoje esmaga a expressão política dos parlamentos nacionais que não são consultados para muitas reformas ou medidas que acabam por singrar em cada um dos espaços nacionais, e nem sempre visando o bem comum e a prosperidade dos povos destinatários dessas medidas. A democracia global, sendo um sistema imperfeito e diferente de país para país, carece de melhoramentos constantes e de uma vigilância permanente. A alternativa é sempre pior e mais perigosa e dispendiosa. Hoje já praticamente todos conhecem o sabor da LIBERDADE - e já ninguém se imagina vivendo privado desse valor absoluto. Um contágio que qualquer dia demanda seriamente a China.

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Evocação de James Callaghan – Barão Callaghan de Cardiff. A mentira política

O tema da mentira política é cada vez mais premente: a sedução pelo poder, pela sua manutenção e reforço, faz com que muitos dos seus agentes recorram frequentemente a esse expediente na esfera pública. Tratam-se de relações tão insólitas quanto perversas e contraditórias, mas cujo objectivo é dominar o sistema político com ilusões que visam criar falsas expectativas nos eleitorados, nas massas, nas multidões de pessoas que, alienadas, se deixam iludir por falsas promessas e falsos enunciados e ainda falsas soluções para os seus problemas.
O nosso tempo veio massificar a mentira, presente na linguagem e nos discursos políticos dos alegados representantes do povo. Em Portugal, o recurso à mentira política vem de trás, não é um exclusivo do actual poder em funções, só que agora a mentira é colossal na forma e no conteúdo. As TIC projectam a mentira a uma velocidade estonteante, as redes sociais podem contribuir para a ampliar (mas também para a neutralizar, desmontando essas mentiras, peça a peça).
Desse modo, vivemos hoje em plena mentira política: a mentira do défice, a mentira da inflação, a mentira da União Europeia e do castelo de cartas em que se tornou a coesão dos países membros da dita UE e, em particular, da zona EURO, a mentira da maior parte dos processos de tomada de decisão. Tudo, na prática, está envolto em simulação, dissimulação, em mistificação, enfim, a política converteu-se num processo sistemático de ilusão que visa dificultar a distrinça do real do imaginário em cada uma das sociedades, em cada um dos sectores da governação. Cada área e sub-área social, económica, financeira, ambiental está sempre envolta em dados contraditórios entre si.
Esta nova (velha) forma de fazer política tem efeitos perversos que vão para além da esfera política, interfere e penetra os comportamentos inter-pessoais, artificializa expectativas e decisões e faz com que uma sociedade inteira acredite naquilo que, de facto, não existe nem vai acontecer, só existe na lógica discursiva dos agentes políticos que recorrem a tais expedientes para manterem e, se possível, reforçarem as suas condições - objectivas e subjectivas - de poder. Sendo certo que a mentira é hoje "colossal", assim como veloz - pela rápida obsolescência das maravilhas e ilusões que propõe às populações que, ingénuas, acríticas e impreparadas não conseguem desmontar as ilusões propostas no lugar do político.
Nesta temática vem a propósito citar uma frase de um ex-PM britânico, que aqui evocamos, James Callaghan, PM do RU de 1976-79, que dizia que a mentira dá a volta ao mundo enquanto a verdade ainda está a calçar as botas.
Este caricato pensamento reconhece o quanto às vezes é sedutora a mentira. Mas, paralelamente, que tipo de sedução poderá existir quando um PM, diante de um país inteiro, tenta convencer todos os seus concidadãos que a nomeação de certas pessoas para certos lugares, não o é por amiguismo político e pagamento de favores, e apenas e tão só radica em critérios de competência, seriedade e transparência?!
Esta persistência na denegação da verdade é, obviamente, uma patologia política - que pode encobrir outras patologias.
Este tipo de persistência em julgar que o ferro é aço, a areia é petróleo e que o latão é ouro só pode redundar em mais estupidez humana, brutalizando a fantasia e a ilusão por parte de quem, como dez milhões e meio de portugueses, já não acredita naquelas mistificações que apenas regista os efeitos negativos da mentira política na vida do seu país, das suas empresas e organizações e na vida particular das pessoas - que até deixam de crer nelas próprias.
Esta difícil relação entre a verdade e a política foi sempre uma constante ao longo dos tempos. Teorizada por Platão, Maquiavel e Weber - entre outros cientistas, filósofos e pensadores - sucedeu que agora os seus efeitos fazem-se sentir com mais acutilância nas esferas social e económica, interferindo na qualidade de vida das populações. Pela natureza das tecnologias da informação que fazem os milagres da ubiquidade, o choque das populações, mais ou menos letradas, com as mentiras políticas fazem com que muitas delas, especialmente as mais letradas e dotadas de massa crítica, façam um exercício de auto-contenção na linguagem utilizada para não recorrer ao vernáculo que aquelas acções e condutas por parte dos agentes políticos suscitam.
Só pela via da LIBERDADE - potenciando a massa crítica de toda uma comunidade - se poderá atingir a VERDADE, e com ambas combater as mentiras com que diariamente o poder vigente, seja no plano micro, meso ou macro vai iludindo as respectivas populações com o fito de prolongar a sua ilusão, condição de reforço do seu próprio poder, ainda que com prejuízo objectivo do interesse nacional.
Só explorando as articulações entre aqueles dois valores absolutos: Liberdade e Verdade poderemos chegar, um dia, a um nível de aceitação democrática em que a maioria das pessoas, como sucede hoje, não seja descrente em relação à democracia que tem e aos políticos medíocres que, infelizmente, assaltaram o Portugal contemporâneo e que são, actualmente, razão de um subdesenvolvimento crónico que veio para ficar.

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GENEALOGIA DA MENTIRA EM POLÍTICA

GENEALOGIA DA MENTIRA EM POLÍTICA:
- Hoje, no debate parlamentar, mais uma vez o PM, Coelho, foi confrontado com o escândalo das nomeações que fez para a EDP (nomeação indirecta) e Águas de Portugal (nomeação directa) por mero amiguismo político e pagamento de favores.
- Contudo, "o homem dos favores e dos tachos p/ os amigos" (em que se converteu coelho) resolveu chamar idiota a dez milhões e meio de portugueses, muitos deles mais qualificados do que ele próprio, denegando indefinidamente esse facto, na esperança de ocultar as evidências flagrantes e tentar continuar a projectar uma imagem de seriedade, transparência e rigor que, manifestamente, passos colho não tem.
- Infelizmente, o recurso a estas técnicas ilusórias e de mistificação do real são cada vez mais frequentes em democracia, daí terem-se tornado num objecto de estudo c/ dignidade cultural, mas as ilusões assim como as mentiras têm a perna curta, pelo que seguramente - e por razões humanitárias - aqueles 10,5 de tugas tenderão a acreditar que Caborga era mesmo aquele tipo em quem os chineses tropeçaram no aeroporto da Portela indicado para a EDP.
- A alternativa a esta mentira é, naturalmente, criar-se outra mentira ainda mais espectacular na esperança de ser acreditada na perversão do tempo democrático em que hoje todos vivemos (ou somos obrigados a viver).
- E isto já não é só lamentável. É EXECRÁVEL.

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quinta-feira

Yuan pode tornar-se a segunda moeda mundial

Yuan pode tornar-se a segunda moeda mundial Controlo do Banco Central chinês permite fixar o valor do yuan perante as flutuações do mercado Getty Images É um sinal dos tempos. O yuan, a unidade monetária chinesa, está a caminho de se tornar a segunda moeda mais valiosa, atrás do dólar, e tirar o lugar ao euro que se encontra numa profunda crise com implicações no seu valor negocial. in Expresso
Um passo essencial para esta "ultrapassagem" foi dado em dezembro, quando a China e o Japão acordaram realizar negócios bilaterais diretamente na unidade monetária chinesa, sem necessidade de conversão para dólar.
Um acordo de peso, uma vez que estamos a falar da segunda (China) e da terceira (Japão) maiores economias do mundo, com transações no valor de 260 mil milhões de euros em 2011, segundo o "Deutsche Welle".
"É um importante passo politico. Reduz os riscos monetários para as empresas japonesas", afirmou Hosuk Lee-Makiyama do Centro Europeu para a Política Económica Europeia, em Bruxelas, à "Deutsche Welle".
Ou seja, se o valor das trocas entre ambos os países era significativo, o volume vai subir ainda mais, dando cada vez mais importância ao yuan.
Liberalização domina Desde 1996, quando autorizou a conversão do yuan para acordos comerciais, a China tem vindo a dar passos progressivos de tornar a sua unidade monetária mais disponível no âmbito da cada vez mais globalizada e liberalizada economia global, dando um papel ao yuan que corresponda ao atual poderio financeiro do "Império do Meio".
Ao aumentar a convertibilidade do yuan, a China está a permitir que investimentos de capital noutras unidades monetárias possam ser convertidos para yuans. Moeda que, por sua vez, pode vir a ser transacionada a taxas de mercado.
Por exemplo, os bancos nacionais de países como o Brasil e a Nigéria já têm ativos em yuans, e as bolsas de Londres e Singapura esperam poder realizar negocias na moeda chinesa quanto antes.
"A tendência é para a liberalização. Não estamos muito longe do nosso objetivo de convertibilidade", disse Zhou Xiaochuan, presidente do Banco Central da China, citado pelo "Deutsche Welle".
Definição artificial
Porém, a maioria dos analistas considera que ainda é cedo para saber se a total convertibilidade estará tão próxima quanto isso, até devido a políticas do próprio Banco Central chinês para proteger a moeda da especulação do mercado.
Por enquanto, o Banco Central chinês controla o valor do yuan, o que lhe permitie valorizar e desvalorizar a moeda como mais lhe convém, sem a expor às flutuações bolsistas e globais.
Assim sendo, apesar da China ser a segunda maior economia do mundo, o yuan ainda representa menos de 1% das transações mundiais, até porque o sistema chinês de controlo das transações ainda é um dos mais burocráticos e complicados do mundo económico.
Contudo, a mudança está inevitavelmente a caminho e a China está cada vez mais aberta às leis da economia global. Obs: A China, vivendo a teoria de um país, dois sistemas, está em franca progressão económica mediante a utilização cada vez mais generalizada da sua moeda, o YUAN. O "novel dólar" do mercado global, e cada vez será mais utilizado atendendo a que a RPC é um país onde a sua população goza de escassos direitos sociais, os chineses trabalham mais horas/semana do que no Ocidente, não têm sindicatos e/ou movimentos sociais e políticos com a força e expressão do Ocidente, de tudo resultando a produção de bens e serviços a baixo valor que entram no mercado global de forma competitiva. A China veio para ficar. Portugal, no seu processo de colonização nc hostilizou a China, a transferência da soberania de Macau para a RPC tb se fez de forma pacífica, pelo que se adivinham tempos de grandes vantagens comparativas entre estas duas nações tão assimétricas entre si no tamanho, nos recursos económicos, no poder e influência mundiais. Mas, curiosamente, têm hoje interesses comuns e complementares - seja no rectângulo, seja no espaço da lusofonia onde Portugal tem posição privilegiada por causa da história e da língua e, sobretudo, na Europa - em que Portugal pode operar como placa giratória para os interesses chineses nesse imenso mercado.

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A UGT de João Proença meteu a pata na poça...

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Algumas notas politico-sindicais de lana-caprina:
1. O Gov conseguiu, de facto, sob muita pressão e algumas promessas (porventura, pessoais e escondidas..) partir a espinha dorsal da UGT, abrindo, assim, uma crise de liderança que culminará com a antecipação da sucessão de João Proença à frente da organização sindical de pendor socialista;
2. O empresariado - que nestas coisas anda sempre na cama política com o Gov - também ajudou à festa, até porque tem interesses objectivos no acordo assinado por J.Proença;
3. João Proença - ficou isolado, alegadamente falseou declarações para se safar da tremenda pressão que está a sentir de vários lados: opinião pública, trabalhadores, dirigentes da pp/a UGT e, doravante, com uma queixa crime por parte da CGTP-In - colonizada pelo PCP e se opunha à assinatura daquele acordo que, em rigor, é mau para os trabalhadores, v.q., os lesa em todas as dimensões dos seus direitos socio-profissionais.
- Ou seja, aquilo que Coelho apresenta como uma vitória traduz-se agora na abertura de um proc. judicial contra J.Proença e que, em termos sindicais, tem como efeito colocar mais manifestantes nas ruas, mais conflitualidade social e, quiça, mais radicalismo sindical nos próximos meses em Portugal.
- Pergunto-me se não seria desejável perder mais uma semana de negociações para que algumas das condições legítimas expostas pelos trabalhadores fossem acolhidas pelo Gov e patrões, e não, como se verificou, ter-se chegado a um diktat do Gov e patronato - que agora só pode traduzir-se numa revolta social ainda maior, porque irreprimível.

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Muere Manuel Fraga, 60 años de pasión por el poder

Una biografía enciclopédica y desmesurada, en la que caben 60 años de la historia de España, un compendio que abarcaría la dictadura, la transición, la democracia y el Estado de las Autonomías, se ha cerrado con la muerte de Manuel Fraga en la tarde de ayer en Madrid a los 89 años al no recuperarse de la afección respiratoria que arrastraba desde principios de año. Tras él desaparece el último eslabón que aún unía remotamente a la derecha actual con el franquismo. Nadie que hubiese ocupado un cargo tan relevante bajo Franco -ni más ni menos que ministro de propaganda- logró salir indemne del desplome del régimen.
Fraga sobrevivió en la política 36 años más,
fue senador hasta el pasado noviembre y se ha muerto como presidente fundador del partido que gobierna en España. Su legendaria capacidad de adaptación le permitió todo eso y más, incluso convertirse en el gran adalid del autonomismo desde su retiro gallego, apenas unos años después de haber intentado frenar el desarrollo autonómico en la nueva Constitución. Tan venerado como odiado, siempre sin medias tintas, se va tras haber conseguido que ni siquiera el más feroz de sus enemigos le niegue ahora una capacidad política excepcional. Será enterrado el martes en Perbes (A Coruña), donde solía pasar sus veraneos, junto a su esposa. La capilla será instalada hoy lunes a partir de la 10.30 en su domicilio de Madrid.
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quarta-feira

O ultraliberalismo do nosso tempo = desemprego + pobreza

Não é já muito relevante saber se João Proença, da UGT, traiu ou não aqueles que representa comprando uma guerra no movimento sindical nacional, pois além de se representar a si próprio, quais gerontes há decadas no poder sindical (e o carvalho da silva, na CGTP-In- PCP é outro geronte ainda maior!!), é secundário ter dado aos trabalhadores aquela meia-hora simbólica, sendo tudo o resto mau para o lado de quem depende do trabalho: dias de trabalho, salários, condições de despedimento, feriados, etc.
Isto culmina numa questão sempre latente na história da evolução das sociedades e que se pode colocar assim: se não existisse o desemprego, seria o próprio regime ultra-liberal que o inventaria. Ele é-lhe indispensável e co-natural. É ele que permite à economia privada manter o seu jugo sobre a população planetária, ainda que sob a capa de contribuir para a coesão social, ou seja, a sujeição envernizada. Sempre foi assim na história da evolução social, com excepções pontuais.
Até porque não existe actualmente melhor meio de constrangimento sobre as populações e de garantia de paz social do que comprimi-la através desta grilheta que se desdobra no desemprego e nas consequências sociais e privações que ele sempre acarreta. De modo que, em Portugal, as usual, o povo é sereno...
O Gov, qualquer que ele seja, fará sempre o jogo do patronato. O Estado, é bom não esquecer é, ele próprio, o patrão de todos nós em Portugal, e se não o é directa e imediatamente, é-o mediante dispositivos indirectos que têm igualmente reflexos na vida dos agregados familiares e das pessoas individualmente. E aqui urge sublinhar que cerca de 85% do tecido empresarial é feito de PMEs ("Piquenas" e Médias Empresa), como diria esse vulto da banalidade que é manola Ferreira leite, agora defensora dessa excelsa ideia de que as pessoas com idade superior a 70 anos deverão pagar os serviços de hemodiálise. Antes tinha sido a promotora da ideia de meter a democracia na gaveta durante um semestre, passando empreender todas as reformas mediante a sua ditadura.
Confesso que ainda não percebi por que razão os media dão tempo de antena a esta idosa salazarenta e mal formada, ainda por cima completamemnte desmiolada pelo que diz, na forma e no conteúdo. É o que dá ter as costas largas em Belém... Até nisto o regime democrático tem azar.
Num país assim, com políticos falhos desta natureza, com um empresariado completamente dependente do patrimonialismo estatal e das suas graças e favores, com uma sociedade civil fraca e subsidiodependente, o resultado só pode ser um: uma pobreza crescente agravada com direitos sociais decrescentes, só estas condições podem levar a aceitar salários miseráveis e condições gerais de trabalho e de vida alinhados com a mediocridade dos políticos, empresários e sindicalistas que temos. Portanto, está tudo em linha ou alinhado pela bitola da mediocridade. No caso, quanto pior, melhor... É nesta senda que Coelho se perfila para acabar com o que restará de Portugal e dos portugueses.
Neste quadro, a imagem que o espelho devolve à sociedade só pode ser a pobreza e o desemprego estruturais. Curiosamente, para os pensadores utópicos do séc. XIX, o fim do trabalho traduzia uma imagem de felicidade, um objectivo supremo que era reivindicado. Mais recentemente, foi também graças à cibernética, então considerada uma (outra) utopia, que findaria a própria ideia do emprego.
Hoje, rebentadas todas essas utopias, entrámos numa outra ficção: a ficção governamental que temos - em boa medida - coligada com o nível do empresariado (subsidiodependente) que nos caracteriza, e que explica tão bem a natureza das relações entre o sector estatal e o sector privado, de que tivémos amostra nas nomeações para a EDP. O que deu a oportunidade a dez milhões e meio de tugas de conhecerem bem a personalidade do PM actualmente em funções em Portugal.
Seja como for, também não devemos pensar que a culpa é da cibernética ou da globalização, esse decisor oculto que está em todo o lado e tudo decide à nossa revelia, mas no mau uso que fazemos dos recursos materais e intangíveis que estão ao nosso dispor.

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domingo

Álvaro e a internacionalização do pastel de nata. Quando a realidade transcende a ficção

Esta semana o país acordou com uma notícia do outro mundo: Álvaro, o ministro da Economia (ou das piadas..) advogou a receita para o combate ao défice e dívida externos de Portugal, indicando a abertura de empresa de bolos como escapatória para a recessão que estamos vivendo. Fê-lo numa conferência de imprensa, como se estivesse a descobrir a pólvora e revelando ao mundo a mais moderna inovação em matéria de teoria económica: a teoria da abertura ao mundo por via da agressividade comercial do pastel de nata. Por momentos, confesso, pensei logo em Paulo Futre e nas suas incursões ao oriente como forma de revolucionar o financiamento aos clubes de futebol sustentado numa revolucionária teoria publicitária e no marketing do séc. XXI. Mas regresso a Álvaro e à fórmula encontrada para recuperar a economia nacional por via do pastel de nata.
Escolheu uma empresa cujo produto está firmado no mercado nacional, e a decisão de avançar para a internacionalização caberá, em rigor, aos próprios empresários do sector que já facturam milhões por ano. Estranho é que o ministro da Economia tenha escolhido uma empresa com enormes lucros e sem nenhuma necessidade de apoio do Estado para se expandir, e não apoiar aquelas outras empresas (mais de ponta e outras do sector primário) - que até empregam mais trabalhadores e apresentam debilidades estruturai e têm maior necessidade de financiamento e de incentivos, para as orientar para os mercados internacionais.
Fica a sensação que o ministro escolheu uma bandeira nacional, como é a empresa já bicentenária dos pasteis de nata muito procuradas pelos turistas, para se promover a si, ao seu ministério e alavancar o Governo no seu conjunto, ao invés de puxar por aqueles sectores de actividade económica que mais carecem de programas de apoio e incentivos à internacionalização: agricultura, pescas, etc..
Sempre que aparece na tela, o ministro Álvaro enche o peito e parece anunciar uma nova revolução dos tempos, promete mundos e fundos mas, em rigor, aquilo que Álvaro faz é apenas fugir da insegurança gerada pela sua falta de visão do que é e pode ser a economia nacional. Tudo lhe escapa: o desemprego, as empresas a fechar portas havendo cada vez mais insolvência, o sentimento de ineficácia nas suas palavras, acções e instrumentos de actuação de política económica, e, no limite, na ideia que faz de Portugal e do que é a governação. Este ministro não passa dum teórico bem intencionado.

Admito até que Álvaro seja um homem bem intencionado que gosta de Portugal, mas não tem a mínima vocação para a governação, o essencial escapa-lhe e é decidido pelo seu mega-colega, ministro das Finanças, o empresariado acha-o ridículo e há muito que já não o leva a sério. Consequentemente, a pasta da Economia está em roda livre, sem ideia directora, sem programas de incentivos à internacionalização e com os factores de produção mais caros da Europa, tornando a produção nacional pouco competitiva nos mercados externos.

Numa palavra, o ministro Álvaro tornou-se já alvo de chacota dentro e fora do Gov, é gozado em toda a sociedade que o acha uma espécie de bobo da corte, imagem agravada com estas ideias ridículas que apenas reflectem a espuma das coisas, passando ao lado das essências que hoje definem as regras da economia mundial.

Grave não é o Álvaro ainda não ter compreendido o ridículo em que incorre quando faz aqueles anúncios urbi et orbi, grave é o ministro da Economia não compreender o sentimento de ineficácia gerador da crise mais global da instituição que o estrutura: o Estado-nacional.

Esta dupla insuficiência - política e cognitiva - que projecta mutações profundas no funcionamento e regras das instituições e, por extensão, na dinâmica das sociedades e no capricho dos mercados, faz com que o proponente de pseudo-ideias (que facilmente incorrem no ridículo, como a internacionalização do pastel de nata pela mão do Estado) traduzam não só uma incompreensão das leis da História e do seu sentido, como também uma congénita incapacidade de compreender que, certos agentes do Estado, nas actuais circunstâncias recessivas em que vivem 10 milhões de portugueses, ocupem o lugar do morto, encontrando-se agora na 1ª linha de visibilidade do Estado por via dos pasteis de Belém.

Por último, deixo uma nota final relativa aos políticos que se têm vindo a adaptar aos media, e nalguns casos revelam-se brilhantes profissionais do sistema. Sabem apresentar um subtil engagement entre grupos de pressão cujos pontos de vista pareciam irreconciliáveis.

No caso vertente, encontramos um homem de boa vontade, mas sem nenhuma ideia, autoridade, rumo e força para fixar qualquer compromisso. Embora, numa coisa estejamos, seguramente, todos de acordo: os portugueses gostam de pastéis de nata, e isso, presumo, seja uma "genial" recordação que o Álvaro sublinha aos portugueses e lega ao futuro.

Amanhã, quando Álvaro já não estiver no Governo e regressar à sua vida inicial, será certamente lembrada no Canadá (e arredores) como o português emigrado que mais fez pela vida do pastel de nata.

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Uma metáfora trágica do Portugal contemporâneo

in tsf
O comandante do navio cruzeiro Costa Concordia, Francesco Schettino, que naufragou sexta-feira à noite, perto da ilha de Giglio, em Itália, foi detido, segundo a agência italiana Ansa.
(...)
Obs: Infelizmente, é também assim que actualmente a maior parte dos países da UE se encontram, submersos e a meter água por os lados. Ou melhor, não é apenas na EDP que as autoridades portuguesas metem água, é na própria Águas de Portugal - que a água que está se soma à água que entra. Daí os pirulitos...

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quinta-feira

Evocação de Diogo de Couto e a Verdade

É sabido que a verdade aleija algumas pessoas, lesa outras e prejudica muitas mais. Sobretudo, se estiverem ligadas ao chamado "xistema" dele usufruindo regalias, benesses, apoios, status e múltiplos privilégios que configuram uma situação de desigualdade e injustiça relativa comparativamente a outros grupos e sectores da população.
Se evoco aqui Diogo de Couto, um estudioso de latim, retórica e filosofia, nascido em 1542, que anos depois vai para a Índia, torna-se amigo de Camões em Moçambique, é porque nunca como hoje a sua postura face à vida deve ser recuperada, até para evitar males maiores nas sociedades modernas. E a grande lição de Diogo de Couto repousa no seu particular conceito de história - que deveria conter (e contar) as "verdades" sem qualquer restrição. Couto era, pois, um defensor da objectividade absoluta, tanto quanto ela seria humanamente possível, ainda que essa frontalidade incomodasse os antepassados que estivessem envolvidos nos acontecimentos que narrava.
Foi seguindo essa convicção que Diogo de Couto, enquanto historiador, criticou os abusos, a corrupção e toda a espécie de violência praticada então pelos mais fortes, pelas autoridades pelas terras da Índia, protestando contra essas arbitrariedades abertamente. Daí a sua coragem e nobreza de carácter..
Portugal, em face do tipo de alguns governos que tem tido, da natureza de alguns agentes políticos que se têm aproveitado do Estado, daqueles agentes corruptos que pesam imenso ao erário público pago pelo contribuinte carece, como de pão para a boca, de homens como Diogo de Couto. Não para denunciar A, B, C ou D e cultivar um espírito mesquinho, persecutório e pidesco que já tivemos durante décadas em Portugal, e que de certo modo ainda nos está enraizado na alma, mas para reforçar a cultura de legalidade, transparência e de justiça social entre os portugueses cada vez menos existente nos dias que correm.
Injustiça essa visível entre nós pelo tipo de nomeações de carácter politico-partidário feita pelo actual Gov, seja para empresas públicas, seja ainda para empresas cuja maioria do capital é de natureza privada, mas em que o Estado guarda ainda um importante poder relativo que lhe permite condicionar, influenciar, vetar decisões que envolvem contratos avultados entre Estado e empresas do sector privado. Uma relação que em Portugal, consabidamente, sempre viveu em estreito conubio.
Infelizmente, o jornalismo de ideias em Portugal ainda conta com meia dúzia de Diogos de Couto entre nós, mas ainda são em reduzido número para ajudar a, por um lado, denunciar as malfeitorias que vão sendo feitas a este nosso querido Portugal em nome do suposto interesse público, por outro lado, ajudar a criar um Portugal onde se respire melhor e o país passe a ser um local melhor frequentado do que é na actualidade.
Diogo de Couto deixa-nos, portanto, um imenso legado: feito de crítica mordaz a um certo funcionalismo, à ambição desmesurada de certos players, ambição à riqueza e ao luxo - típica dos novos ricos, à opressão aos sectores mais pobres e indefesos da população e da sociedade, à falta de dignidade e de carácter de certas pessoas e à deslealdade entre elas nas suas múltiplas relações.
O exemplo de vida, coragem e nobreza de carácter representado por Diogo de Couto é demasiado relevante para ter sido em vão...

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quarta-feira

O sentido da História. Evocação de Edward Hallet Carr

História política, económica e social do séc. XX-XXI - aparece neste filme como um dos aspectos mais interessantes nestas mega-narrativas e interpela-nos acerca de saber qual o papel da casualidade na dinâmica histórica. Ou seja, perante a impossibilidade de se equacionar todos os aspectos na equação histórica, o historiador escolhe os que se afiguram mais interessantes, como defendeu Edward Hallet Carr, um dos experts da revolução soviética e também jornalista, historiador e brilhante teórico das RI.
O que significa que tudo aquilo que escapa à investigação mas tem efeitos significativos na dinâmica histórica, integra o acaso. E é aqui, segundo alguns historiadores, que a História converge para o domínio da Filosofia. Este filme acaba por ser um pouco de tudo, deixando, naturalmente, muitos factos relevantes de fora, até porque muitos deles ainda são do nosso desconhecimento. O que confere à História de tendência longa - (mais estrutural do que conjuntural) um certo encanto e fascínio, é que a História é, acima de tudo, futuro. E esse é indeterminável.
- A sagesse de Carr consistiu em compreender que a objectividade em história, como em qualquer ciência social, é uma utopia, daí a subjectividade da história e do historiador, já que não existem factos indepenendentes da interpretação de quem procura investigar e fazer história. Weber antes de Carr tinha concluído isso, e antes deste sociólogo já I. Kant tinha percebido a importância da intersubjectividade na produção do conhecimento humano.
- A essa luz, o passado só pode ser analisado à lupa do presente, e a história é uma ciência interpretativa, e não de relato linear de factos indiscutíveis. Foi o que, na realidade, a sucessão brutal das imagens apresentadas no video me evocaram. Daí ter recordado o legado teórico deste excepcional historiador britânico que deixou uma considerável influência na forma de entender a história do séc. XX, dos seus conflitos mundiais e da própria dinâmica das relações internacionais.
- Desse modo, o estudo da história afigura-se como o estudo das causas e dos porquês, e não tanto a questão do que aconteceu. Na prática, o homem está sujeito a leis e princípios de racionalidade, e qualquer acção da sua parte pressupõe uma causa racional. Carr preocupou-se em estudar e agrupar o estudo dessas causas em função da sua importância relativa.
- De Hegel e Marx recuperou a ideia de progresso da humanidade, feita de teses, antíteses e sínteses. Cabendo ao homem moderno ser capaz de se compreender a si mesmo e ao processo histórico que integra de forma inédita. Eis a sua singularidade. - Por último, ao revisitar todas aquelas imagens, umas por conhecimento histórico mais remoto, outras porque as estudei integradas nos acontecimentos históricos do séc. XX, que foi um século dos conflitos e de duas guerras mundiais, temos a obrigação de compreender que o historiador não se consegue colocar "fora" da história e do tempo, sendo a revolução tecnológica um acelerador desse progresso material e espiritual. Além que de que a história também deixou de ser a narrativa acerca das elites e passou a ser a história dos povos, dos movimentos operários e dos movimentos sociais, nacionais e transnacionais.
- Tudo estando em mudança constante, assim como a própria história. É isso que faz dela uma ciência dinâmica, uma ciência de futuro, em permanente evolução.
- Edward Hallet Carr sabia, para concluir, que a história não vive daquela suposta objectividade, reclamada pelas ciências exactas. E foi essa circunstância que o fez perceber que o seu domínio de investigação converge com os domínios de interesse da Sociologia, da Ciência Política, da Psicologia, da Antropologia e das demais ciências sociais em geral. Carr sabia tudo isto, fez história com base nesse relativismo do conhecimento, e também por isso foi um cientista social de excepção que influenciou a própria história das ideias, dos métodos e processos de fazer história.
Ainda que para isso tivesse que refutar a possibilidade de objectividade da história. Actualmente, ao invés do passado, os factos e os comportamentos económicos, financeiros, políticos, sociais e religiosos, com a generalização do neocapitalismo, ganharam autonomia relativamente às velhas ordens institucionais que os regulavam e orientavam. Hoje a obediência às leis da esquizofrenia do mercado subverteu tudo.

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